Viena, (Lusa) – Grupos criminosos com motivações políticas em África estão a usar os lucros da mineração ilegal de ouro e outros minerais para controlar territórios, agravando conflitos armados e prejudicando a autoridade dos Estados, alertou hoje a ONU.
No relatório sobre “Crime nos Minerais: Extração Ilegal de Ouro”, hoje publicado, e “Análise Global sobre Crimes que Afetam o Ambiente”, os dados mostram que a mineração e transporte de ouro de forma ilegal tem vindo a crescer no continente africano, e a procura global de minerais estratégicos, como o lítio, o cobalto ou o cobre, “converteu-se num dos principais motores de instabilidade” nomeadamente nas regiões do Sahel e África Ocidental.
O ouro extraído ilegalmente em países como Mali, Níger, Burkina Faso ou Chade é frequentemente contrabandeado para mercados como os Emirados Árabes Unidos, Suíça ou Índia, segundo dados do relatório do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC).
O relatório destaca as discrepâncias significativas entre os volumes exportados por países africanos e os importados por estes destinos, revelando práticas de branqueamento e falsificação de origem.
Segundo a investigação da ONU, “os lucros gerados servem para financiar milícias armadas, comprar armamento e corromper autoridades”.
“À medida que o mundo aposta em tecnologias sustentáveis — como carros elétricos e turbinas eólicas — cresce também a procura por minerais como o lítio, o cobalto ou o cobre, essenciais para baterias, ímanes e componentes de transição energética”, frisam ainda os responsáveis por este relatório, que se foca na análise do comércio do ouro e de minerais críticos.
A agência da ONU frisou que, alimentada pela procura global de minerais estratégicos, esta procura converteu-se num dos principais motores de instabilidade em regiões como o Sahel, a África Ocidental e a região dos Grandes Lagos.
“A Agência Internacional de Energia prevê que a procura por minerais críticos continue a aumentar nas próximas décadas, até 2050”, salientou.
Quando a oferta não acompanha a procura, indicam, “multiplicam-se as oportunidades para a criminalidade organizada”: as redes ilegais controlam minas, rotas comerciais e instalações de refinação, usando corrupção, coerção ou violência.
Países como a República Democrática do Congo, Sudão do Sul e República Centro-Africana são exemplos de como os recursos naturais podem perpetuar conflitos prolongados e agravar crises humanitárias, segundo a ONU.
Por sua vez, as comunidades locais são frequentemente vítimas colaterais destas práticas, porque a mineração ilegal está associada à degradação ambiental, desflorestação, despejo de resíduos perigosos, poluição da água e do solo, e perda de meios de subsistência.
Também é evidenciado que as mulheres e as crianças enfrentam riscos acrescidos de exploração sexual, tráfico humano e trabalho forçado.
“Só na África do Sul, entre 8.000 e 30.000 pessoas poderão estar envolvidas em mineração clandestina, muitas delas em condições de extrema vulnerabilidade”, refere-se.
Apesar de alguns países africanos exportadores — como o Gana, Zimbabué ou Moçambique — tentarem reforçar a fiscalização, os organismos reguladores enfrentam falta de recursos, corrupção institucional e interferência política, criticou a agência da ONU.
Para a agência da ONU, a emissão de licenças, os processos de concessão mineira e os controlos alfandegários continuam permeáveis à fraude.
O relatório do UNODC concluiu que a extração e comércio ilegais de metais e minerais prejudicam a estabilidade política e económica de países ricos em recursos, ao privá-los de receitas fiscais, fomentar a corrupção, enfraquecer a governação e perpetuar ciclos de violência.
As Nações Unidas recomendam o reforço de mecanismos de cooperação internacional, a criação de um quadro legal mínimo para a rastreabilidade do ouro, e maior envolvimento das comunidades locais.
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