Lisboa, (Lusa) – O infecciologista Jaime Nina disse à Lusa que África enfrenta uma situação de epidemia de Mpox (Monkeypox), mas continua sem acesso adequado a vacinas ou medicamentos, situação que piorou com os cortes da ajuda internacional.
“A epidemia de mpox na África alastrou-se da República Democrática do Congo [RDCongo, país que faz fronteira com Angola] para países vizinhos como o Uganda, o Burundi e o Ruanda, mas o continente permanece sem acesso adequado a vacinas ou medicamentos”, declarou o professor jubilado do Instituto de Higiene e Medicina Tropical (IHMT) da Universidade Nova de Lisboa.
O investigador reiterou que estes países que sofrem com a epidemia não têm meios para erradicar a doença e que “a única forma de travar o mpox seria através da vacinação de toda a população a partir da África Subsariana: do Senegal [país vizinho da Guiné-Bissau] até ao norte de Moçambique”.
Na sua opinião, é necessário um investimento global e uma atuação mundial homogénea para se combater doenças virais, que contrasta com os atuais cortes de financiamento internacional por parte dos Estados Unidos.
“Estas doenças ou estão erradicadas no mundo inteiro ou não estão erradicadas”, sublinhou.
Devido à escassez de uma rede de laboratórios nestes países africanos, o docente diz acreditar que o número de casos relatados é apenas “a ponta do iceberg”.
No entanto, o infecciologista destacou que a doença é endémica na região, por isso existem “sempre casos”.
Para Jaime Nina, o aumento de casos está diretamente ligado à descontinuação da vacinação contra a varíola (doença erradicada desde 1980) e à pobreza estrutural que força populações a caçar para sobreviver, aumentando o contacto com reservatórios naturais do vírus.
“O mpox é uma zoonose [circula entre animais e humanos] com reservatórios em roedores e primatas africanos. Quando se mata o que há para comer, o risco de transmissão para humanos aumenta drasticamente”, contextualizou.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) a doença foi primeiramente identificada como “varíola dos macacos” porque, em 1958, foi detetada em vários macacos de um laboratório na Dinamarca e assemelhava-se com a varíola.
Contudo, o isolamento viral provou tratar-se de um “primo” da varíola, originado a partir de reservatórios animais, especialmente roedores africanos, em zonas florestais, frisou o docente.
Jaime Nina esclareceu ainda que o nome “Monkeypox” é uma designação incorreta: “Nem é varíola, nem é dos macacos”, lamentou.
O primeiro caso num ser humano foi notificado em 1970 na RDCongo, de acordo com a OMS.
O investigador destacou ainda que há dois grandes clades (grupos genéticos) do vírus: o clade I, da África Central (mais letal), e o clade II, da África Ocidental.
Portugal registou casos do clade II, a variante da África Ocidental – da Nigéria ao Senegal – a partir de 2022 devido à transmissão por contacto social. No entanto, como a maioria dos casos em Portugal, e nos países europeus, estava circunscrita a homens homossexuais, foi possível “conter a propagação à população em geral”, explicou Nina.
A agência de saúde da União Africana (UA) declarou o mpox uma emergência de saúde pública de segurança continental em 13 de agosto de 2024 e, no dia seguinte, a OMS anunciou o estado de alerta sanitário internacional para a doença, uma medida que decidiu prolongar.
O mpox é uma doença infecciosa que pode causar erupções cutâneas dolorosas, inchaço dos gânglios linfáticos, febre, dores de cabeça, dores musculares, dores nas costas e falta de energia.
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