Angola e África do Sul ligadas pelo desenvolvimento comum

Luanda – Angola e África do Sul mantêm uma actuação conjunta que tem sido fundamental para a promoção de uma agenda compartilhada de desenvolvimento de ambos os países e da África Austral.

O facto foi expresso pelo embaixador de Angola na África do Sul, Rui Orlando Xavier, em entrevista à ANGOP para, entre outros assuntos, abordar a cooperação entre os dois países.

Durante a conversa, o diplomata abordou, igualmente, questões relacionadas com os investimentos sul-africanos em Angola, a formação de quadros angolanos naquele país, entre outros aspectos.

Eis a entrevista na integra:

ANGOP – Como avalia o actual nível da cooperação entre Angola e África do Sul?

Rui Xavier (RX) – As relações entre Angola e a África do Sul são excelentes com uma agenda de cooperação em diversas áreas, como o comércio, investimentos, segurança, infra-estruturas e outras. Essa parceria tem gerado benefícios mútuos e contribuído para o desenvolvimento socioeconómico de ambos os países.

A nível multilateral, os dois países procuram coordenar posições em fóruns nacionais e internacionais, com vista a fortalecer as suas vozes e influência no cenário global. Essa actuação conjunta tem sido fundamental para a promoção de uma agenda compartilhada de desenvolvimento, estabilidade e resolução de conflitos na região.

ANGOP – Há vozes segundo as quais as relações entre os dois países têm conhecido “alguns altos e baixos” nos últimos tempos. Quer comentar?

RX – Pelo que afirmei acima, não creio que as relações entre os dois países estejam a conhecer ” alguns altos e baixos” como questionou. As relações entre os dois países estão cada vez mais consolidadas, como provam as visitas efectuadas pelo Presidente Cyril Ramaphosa a Angola, em Agosto, e esta próxima visita do Presidente João Lourenço à Africa do Sul.

ANGOP – Que enquadramento faz da próxima visita de Estado do Presidente João Lourenço à África do Sul?

RX – A próxima visita do Presidente João Lourenço à África do Sul afigura-se de muito importante, pois será uma grande oportunidade para os dois Presidentes, uma vez mais, poderem discutir as relações bilaterais existentes entre os países e formas de incrementá-las com a assinatura de diversos acordos e passar em revista os assuntos candentes existentes na nossa região, no continente e a nível global.

ANGOP – Qual é o volume de negócios entre os dois países e quais os sectores que mais se destacam?

RX – O volume de negócios entre os dois países para o período de Janeiro a Setembro de 2024 foi de foi de USD 788.092.779,64.

ANGOP – Tudo indica que a balança comercial tem sido favorável à África do Sul, tendo em conta o volume de importações do lado angolano. Que produtos é que Angola exporta para a África do Sul ?

RX – Como acima referimos, a balança comercial é favorável a Angola, exportando para a Africa do Sul petróleo e diamantes que representam 98% e 1%, respectivamente.

ANGOP – Regista-se, presentemente, um excedente na produção de energia em Angola. Há contactos entre os dois países para a compra de energia do nosso país?

RX – Como é do conhecimento, a África do Sul atravessa um período de défice no fornecimento de energia para alimentar todo o seu sector produtivo e lares.

Angola, neste momento, já é auto-suficiente na produção de energia e estamos prontos a vender à África do Sul, desde que o sector privado sul-africano ou outro abrace essa iniciativa com a construção de linhas de transporte de Angola para a África do Sul via Namibia. Durante a visita presidencial essa questão será abordada pelos dois Presidentes e esperamos por uma solução positiva. Essa é também uma forma de cooperação Sul-Sul.

ANGOP – Que vantagens tem para Angola o facto de a África do Sul assumir a presidência do G20?

RX – Angola assumiu uma posição de importância relevante ao expressar, pela voz do Presidente da República, a sua opinião e ser parte da Cimeira do G20 recentemente realizada no Rio de Janeiro, ao lado das nações mais importantes do mundo.

Angola apoiará as iniciativas que a África do Sul desenvolver aquando da Presidência do G20, no sentido de encontrarmos soluções nos mais vários domínios para o nosso planeta e populações.

A participação de Angola no próximo ano, na cimeira do G20 na África do Sul, como convidada, já por ocasião da liderança do Presidente João Lourenço na União Africana, acabará por criar condições para o país continuar a acompanhar de perto a agenda das maiores economias do mundo, pelo que, Angola poderá obter grandes vantagens.

ANGOP – A segurança alimentar é um dos grandes desafios do Executivo angolano. O que tem sido feito para atrair investimentos sul-africanos para a cadeia de produção alimentar, tendo em conta as suas potencialidades nesse domínio?

RX – De facto, a segurança alimentar não constitui apenas um problema do Executivo angolano, porém, é um desafio de todo o sistema internacional, que se vai agravando com as crises e os conflitos internacionais.

E, para fazer face a este constrangimento, o Governo angolano tem trabalhado cada vez mais na criação de um ambiente favorável ao investimento estrangeiro e, sobretudo, em sectores prioritários como é o caso da Agricultura e Agro-indústria.

Portanto, reconhecemos as capacidades sul-africanas nestes domínios, razão pela qual temos recebido associações e cooperativas agrícolas locais que manifestam o interesse de investir em Angola.

É neste sentido que a Embaixada tem divulgado o processo de reformas levadas a cabo pelo Governo, com destaque para a nova lei de repatriamento de capitais, a própria lei do investimento privado, as suas garantias e direitos, a disponibilidade de terras aráveis, água, enfim, um leque de vantagens que, com mais empenho da parte angolana, poderá levar os homens do Agro-negócio sul-africanos a investirem em Angola.

ANGOP – Quantas empresas sul-africanas actuam em Angola e em que sectores?

RX – Desde 1995, foram registados 119 projectos no valor total de USD 1.187.718.903,00 em diversos sectores com intenção de implementação nas 18 províncias, sendo Luanda com um número de 91 projectos correspondentes à 76%.

Os sectores mais visados são o Comércio (16%), Construção Civil (17%), Imobiliário (25%) e Indústria (21%).

É de lamentar que o sector agrícola que deveria ser um dos focos principais para a luta contra a fome e alimentar represente somente 3% no total dos projectos registados.

ANGOP – A diversificação da economia de Angola é uma das apostas do Executivo. Em que sectores o Governo e os empresários sul-africanos têm demonstrado mais interesse?

RX – Os empresários sul-africanos têm manifestado interesse em investir em Angola nos sectores das minas, turismo, energia e infrastruturas.

ANGOP – No domínio do turismo que incentivos existem para que turistas sul-africanos visitem mais Angola?

RX – Nesse domínio podemos informar que está em preparação a realização, no próximo ano, de um Fórum sobre o Turismo na Cidade do Cabo com a participação do ministro do Turismo de Angola e promotores do turismo angolanos, com vista a dar a conhecer as potencialidades turísticas de Angola e, por conseguinte, atrair turistas sul-africanos.

ANGOP – Sobre a cooperação no domínio da formação de quadros, tem uma estimativa do número de angolanos que estudam actualmente na África do Sul e em que especialidades?

RX – Existem muitos alunos angolanos a estudar no sistema de educação sul-africano, mas de forma directa, isto é, a custo dos seus pais ou tutores. De recordar que não existe um acordo entre os dois países no tocante à atribuição de bolsa de estudos por parte da África do Sul a cidadãos angolanos, pelo que a Embaixada não tem um número exacto dos cidadãos angolanos que estudam neste país.

Contudo, podemos avançar um número aproximado de estudantes angolanos nas Universidades públicas em Joanesburgo, com 35 estudantes na Universidade de Tecnologia, sete na Universidade de Joanesburgo e dois na Wits.

Na jurisdição de Cape Town, estima-se que existam entre 250 a 300 estudantes distribuídos pelos seguintes segmentos educativos: Ensino primário; médio; superior; pós-graduação e em cursos de inglês e técnico profissional.

ANGOP – Como está estruturada a comunidade angolana aqui residente e quantos estão registados na Embaixada?

RX – A presença da diáspora angolana na África do Sul remete a décadas, quando muitos cidadãos angolanos buscaram refúgio no país vizinho após os conflitos armados em Angola. Esse fluxo migratório transformou a composição demográfica de certas regiões sul-africanas, como Gauteng e Cidade do Cabo.

A diáspora angolana apresenta um perfil socioeconómico diversificado. Encontram-se desde profissionais como médicos, engenheiros, empresários, até trabalhadores manuais e migrantes em situação de bastante vulnerabilidade.

Ao longo dos anos, a diáspora angolana tem-se integrado de forma cada vez mais na sociedade sul-africana.

Existe uma maior aceitação dos migrantes angolanos às normas e costumes locais, mas também uma maior aceitação e respeito da população sul-africana, em relação à nossa comunidade.

Um factor importante de integração é a formação de redes de apoio e solidariedade entre os membros da diáspora.

Essas redes fornecem assistência mútua, facilitam o acesso a serviços e oportunidades, e promovem a preservação da identidade cultural angolana em território sul-africano.

Paralelamente, a diáspora angolana tem participado activamente em eventos e actividades comunitárias sul-africanas, que resultam no fortalecimento de laços entre as duas nações.

De referir que alguns angolanos, hoje com nacionalidade sul-africana, ocupam cargos em órgãos governamentais e participam de debates e formulação de políticas públicas, exercendo influência sobre questões que afectam directamente a diáspora. Além disso, a diáspora angolana mantem estreitos laços com a política de Angola, acompanhando de perto os acontecimentos no país de origem.

Apesar dos avanços na integração da diáspora angolana na sociedade sul-africana, ainda existem desafios a serem superados. Um deles é a xenofobia e o outro a burocracia na obtenção de documentos, acesso a serviços públicos e oportunidades de emprego.

Estima-se que actualmente vivam na província do Cabo do Norte cerca de 25 mil angolanos dos quais 12 mil estão registados no Consulado em Cape Town, assim como dois mil angolanos descendentes, perfazendo a total de 14 mil angolanos registados.

Um factor importante de integração é a formação de redes de apoio e solidariedade entre os membros da diáspora.

Por outro lado, o Consulado Geral em Joanesburgo tem registado cerca de 9,500 mil cidadãos angolanos que vivem nas províncias do Free State, North West, Limpopo e Kwazulu Natal.

ANGOP – No contexto regional, Angola e África do Sul colaboram para garantir a paz, segurança e estabilidade na região, com principal realce para situação na RDC. Como é que o embaixador vê o desempenho da África do Sul nesse sentido?

RX – O empenho do Governo da África do Sul para a estabilização da paz e a segurança na região é total e alinha-se nos marcos estabelecidos pela SADC.
Perfil

Nascido a 12 de Outubro de 1954, em Luanda, Rui Orlando Ferreira de Ceita da Silva Xavier é licenciado (Universidade Autónoma de Lisboa) e mestre em Relações Internacionais.

Já exerceu os cargos de embaixador de Angola no Japão, director do Ministério das Relações Exteriores para os Assuntos Multilaterais, chefe do Departamento da Divisão de Agências Especiais e da Direcção dos Assuntos Multilaterais, ministro-conselheiro na Embaixada de Angola em Portugal, chefe do Departamento da Europa Ocidental, bem como conselheiro da Embaixada de Angola na Itália.

Na sua folha de serviço, destacam-se também as funções de chefe do Departamento da Organização de Unidade Africana (OUA), hoje União Africana (Direcção África e Médio-Oriente), e do Departamento das Relações Externas do Ministério das Relações Exteriores (MIREX) de Angola.

ANGOP

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