“É preciso agilizar a reparação” num Brasil onde faltam oportunidades para negros – escritora

Lisboa, (Lusa) – A escritora brasileira Patrícia Xavier alertou que o Brasil ainda “é um país racista”, pois a falta de oportunidades para negros e as desigualdades mantêm-se desde o tempo da escravatura, e pede políticas públicas que agilizem esta reparação.

Numa entrevista à Lusa, em Lisboa, a escritora, e também jornalista, salientou que os negros no Brasil, a maioria da população do país, “são os que têm menores salários, as mulheres principalmente”, e isso deve-se a “todas as questões que premeiam o racismo e o preconceito” e a “toda a herança que vem da escravidão”, havendo, assim, “uma falta de oportunidades que é histórica” e defendendo uma reparação agilizada.

“Temos um país, infelizmente, racista e uma população negra que sofre até hoje as consequências e as violências do que foi feito com os antepassados. Então a gente precisa falar sobre isso”, defendeu.

A indignação perante “o preconceito” e “as injustiças” cometidas contra a população negra do Brasil, e nunca reparadas, foram o mote para Patrícia Xavier escrever o seu primeiro romance “Céu azul é tempestade”, que lançou em Portugal no passado dia 13, na Livraria Snob, em Lisboa, e que apresentará esta semana em Espanha.

No livro, a autora fala de reparação financeira pelo sofrimento vivido por aquela população durante séculos, salientando à Lusa que, quando se fala deste assunto, “as questões são sempre as mesmas: de onde se vai tirar dinheiro, quanto vai ser feito, quanto vai se pagar, quem vai receber”.

Na sua abordagem, quer que se entenda porque a reparação financeira “é importante”, mas também espera “abrir a porta para uma conversa muito ampla” sobre o que pode ser, pois, na sua opinião, não é só dar dinheiro, é investir em políticas públicas com um foco na comunidade negra.

Para a escritora, as políticas no Brasil que incentivam as crianças a ficarem na escola, a grande conquista das quotas para alunos negros nas universidades, que mudou gerações, e as empresas no país que abrem quotas para negros “também é reparação”, mas, alertou, é preciso muito mais do que isso.

Pegando no seu exemplo, que teve a sorte de ter pais que, não tendo frequentado a universidade, deram tudo para que os filhos tirassem um curso universitário, a escritora defendeu que são necessárias políticas públicas, nomeadamente para a educação, mas também para a igualdade de oportunidades e de salários para os negros no trabalho.

Na infância, “é preciso garantir que as crianças vão à escola”, frisou, porque muitas mães deixam-nas com os vizinhos por falta de dinheiro.

Além disso, é preciso “dar crédito ao micro empresário negro”, porque estes ainda se debatem com dificuldades de acesso a empréstimos, acrescentou.

Para que as políticas avancem, Patrícia Xavier considera que o Governo Federal deve dar as grandes diretrizes políticas, e os governadores do estados e os prefeitos, mais próximos dessas comunidades, devem empenhar-se em criar medidas concretas e colocá-las em ação.

Essas políticas, “com foco” na população negra, devem seguir o caminho das pessoas desde a infância, na escola, passando pela faculdade e chegando ao mundo do trabalho, frisou.

E, no seu entender, o debate da reparação deve ser levado para as escolas.

A sua proposta “é estimular uma conversa [entre todos, brancos e negros] e agilizar o que precisa ser feito”, para rapidamente reduzir desigualdades.

Como é que uma população, cujos “antepassados foram sequestrado e escravizados e, de repente, deixados sem nenhuma oportunidade, sem direito de comprar a terra, tendo de trabalhar pela sua própria liberdade”, e que continua a não ter oportunidades, “diminui essa distância, e rápido?”, questionou.

Em “Céu azul é tempestade”, a personagem principal, Tereza, e os seus filhos tornam-se as primeiras pessoas negras da cidade de Águas Correntes a receberem uma reparação financeira pelo trabalho dos seus antepassados escravizados.

ATR // MLL

Lusa/Fim

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