Se considerar que em Angola existe 0,18 médico para mil habitantes e uma taxa de fecundidade estimada em 5,52 filhos por mulher, não é de se estranhar que o país registe 239 mortes por cada 100.000 bebés nascidos vivos.
Grave: o ideal é que haja 3,5 médicos para cada mil habitantes.
Um número escabroso que coloca Angola como o 8º país com a maior mortalidade materna no continente, atrás apenas de países como Chade, Sudão do Sul, Somália, República Centro-Africana, Nigéria, Sudão e República Democrática do Congo.
As doenças hipertensivas na gravidez e as hemorragias são as principais causas de morte materna. Existem doenças também pré-existentes na grávida, uma vez que pode ser diabética, hipertensa, obesa ou ter uma cardiopatia. Tudo isso acaba por interferir com as patologias no parto.
Não é por outro motivo que a literatura médica recomenda que a partir do terceiro mês é crucial que a gravidez seja seguida por profissionais, que acompanham e antevêm quaisquer tipos de complicações, que podem ser acauteladas e, muitas vezes, evitadas.
Mas como fazer esse acompanhamento se não tem médicos suficientes? Estima-se que os hospitais realizam apenas 50% dos partos no país. Os outros 50% estão nas mãos das parteiras fora dos hospitais.
Os riscos dos partos feitos em casa
As hemorragias podem ocorrer, justamente, quando uma paciente iniciou o trabalho de parto no domicílio, onde não há condições fisiológicas para ter um parto transpélvico, e estaria indicado para uma cesariana. Neste caso, as técnicas utilizadas em casa, para esforçar o trabalho de parto, podem acabar por levar a uma ruptura uterina.
Em muitos casos, o bebé já nasceu, porém o facto de ficar uma membrana retida, ou no caso de a placenta não ter saído completamente, pode originar uma hemorragia pós-parto.
Outro problema é a taxa alta de prematuridade. Os prematuros, normalmente, nascem por ruptura de membranas. Ou podem estar associados a doenças hipertensivas da gravidez, ou, eventualmente, a um quadro de hemorragias que podem levar à necessidade de tirar os bebés antes do tempo.
De acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), a taxa de mortalidade infantil média em Angola até cinco anos é de 69 crianças por cada mil nascimentos. Em África, em 2020 foi de 48,4 mortes por 1.000 nascidos vivos.
Orientação às mães via SMS, uma ferramenta para superar o problema
Já que o Ministério da Saúde não toma as providências e protege a vida da mãe e do bebê, o Hospital Materno Infantil Manuel Pedro Azancot de Menezes, de Luanda, lançou em 2022 o “Monami”, programa de autocuidado para mulheres gestantes.
Com envio de informações via SMS, as grávidas tomam conhecimento sobre as medidas de prevenção e complicações na gravidez, que podem levar à morte da mãe, do bebé ou de ambos.
Passado um ano da fase piloto, o objetivo agora é levar o “Monami” a um maior número de mulheres nas outras 17 províncias do país, além de Luanda.
O “Monami” contou inicialmente com o apoio financeiro da Fundação Calouste Gulbenkian, que permitiu ao parceiro Appy People desenvolver a plataforma digital do programa e pagar aos agentes envolvidos. Desde que foi lançado, o programa já alcançou 30 mil mulheres.
Manuela Mendes, médica de ginecologia e obstetrícia há 50 anos, referiu que a sua longa experiência na área levou-a a aproveitar as novas tecnologias para enviar mensagens simples, mas com o poder de impactar positivamente na saúde das mulheres e dos recém-nascidos.
“Quando essas mulheres não são bem seguidas, quando não se tem um plano definido para o parto, naturalmente vamos ter muitas complicações, tais como hemorragias, prematuridade, nados mortos. São alguns problemas que ainda temos que resolver, como também mudar a condição social das mulheres, empoderá-las, dar maior capacidade financeira para elas poderem tomar conta de si”, disse.